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Tanya: a vida e carreira da artista de música popular portuguesa

Atualizado: 21 de jan. de 2024

O CONTRAPONTO viajou até ao Algarve para conhecer a vida e a carreira da Tânia (que utiliza Tanya como nome artístico), cantora e professora de fitness.


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Tanya durante um concerto em Armamar. Fotografia: Miguel Rocha Pinto


Tânia Lima, 43 anos, é cantora e professora de fitness. Natural de Vila Franca de Xira, mas passou a infância em Alenquer. A terra onde se fez gente e descobriu a paixão pela música. Em 2022 participou no reality show Big Brother Famosos, programa que fez com que o público conhecesse melhor a Tânia mulher e a profissional. Em 1995, com 15 anos, deu os primeiros passos na música numa festa da escola e, a partir daí, seguiu caminho musical. Começou a carreira a solo e, em 1998, é convidada para pertencer à dupla Tayti. Foram 14 anos de sucessos até que em 2012 decide deixar o projeto e fazer uma pausa na música.  


O CONTRAPONTO (C) viajou até ao Algarve para conhecer a vida e a carreira da Tânia.


C: Olho para ti, fruto do que vi no Big Brother, e vejo uma pessoa tranquila e ponderada. Sempre foste assim ou a vida fez com que te tornasses assim? 


TÂNIA (T): Não sou uma pessoa calma nem ponderada. (Risos) Tenho é uma pessoa ao meu lado que me ajuda a ser assim, porque eu sempre fui muito energética. Antes de vocês chegarem, estava aqui a minha cara-metade e estava a dizer que eu às vezes estou a pensar numa coisa, depois estou a pensar noutra e depois já vou ali e, entretanto, vou a outro lado... As pessoas têm de me acompanhar neste meu raciocínio e nem sempre é fácil. Sou muito ponderada quando tento passar um pouco da imagem que eu quero que as pessoas percebam quem é a Tânia, porque se verdadeiramente começasse aqui a falar contigo iria haver coisas que tu não conseguirias apanhar. (Risos) Portanto, tento ser uma pessoa mais ponderada sim quando estou numa conversa, porque quero que as pessoas percebam a pessoa que eu sou, mas nem sempre sou assim. 


C: Como é que foi a infância em Alenquer? 


T: Muito feliz! Entre Alenquer e Ota, fui mesmo muito feliz. Quando fui para a escola preparatória de Alenquer passava muito tempo com o meu pai, porque ele tinha uma loja de sapatos onde os vendia e consertava. Todos os dias almoçava com ele. Portanto, a minha vida foi vivida muito entre Alenquer e Ota, porque em Ota tínhamos a nossa em casa e em Alenquer tínhamos a sapataria e era onde estudava. Foi uma infância muito tranquila e feliz!


C: Houve momentos difíceis? 


T: O único momento mais difícil que tive e estou a lembrar-me agora por me perguntares, foi quando perdi a minha avó paterna. Era a única avó que tinha viva na altura, chamava-se Regina, e era uma avó que tinha um amor incondicional por mim... era uma amor de avó. Foi uma perda muito grande e a fase mais triste da minha vida até aos meus 32 anos.



C: Começas a cantar na Escola Preparatória de Alenquer, por causa de um desafio que te lançaram. Como é que foi? 


T: Então, em 1995, tinha eu 15 anos, a minha professora de francês achou que seria interessante cantar uma canção em francês na festa da escola, já que eu não era muito boa aluna e assim poderia subir a nota. Achei logo que não seria muito boa ideia cantar à frente de tanta gente... meu Deus, eu nunca tinha cantado em público, era sempre em casa e à frente do espelho com uma colher da sopa (risos). Entretanto, ela conseguiu convencer-me. A minha professora de música também me ajudou e a coisa aconteceu. Cantei, na tal festa em dezembro o “La Vie En Rose” da Edith Piaf. Estava muito frio, portanto, as minhas roupas eram quentes e eu suava muito. Por momentos, pensei que os meus colegas não iam gostar e que tudo ia ser horrível, mas no fim fui aplaudida por todos. Acabou por ser um dia muito feliz!


C: É aqui que percebes que a música fazia parte de ti? 

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Tânia em criança. Fotografia: Tânia Lima

T: Eu já sabia que a música fazia parte de mim. Só que os meus pais diziam-me sempre “não é vida para ti”, “tu não podes seguir essa carreira, porque isso não é um trabalho”... estavam sempre a meter-me isso na cabeça. Porque eu já cantava... o meu pai aos fins de semana tinha de ir à Benedita buscar sapatos para a loja e eu muitas vezes ia no carro com ele a cantar as músicas do Carlos Paião e não só. Sentia que aquilo estava feito para mim e quando contei ao meu pai o que aconteceu, ele diz-me “bom, ok, então vamos ter de mudar o rumo da tua vida”. Foi aí que as pessoas me começaram a ajudar para ir ter uma entrevista à Rádio Voz Alenquer e a ser reconhecida na zona. Daí até gravar um CD foi um pulinho!


C: Na altura aceitaste bem a posição dos teus pais relativamente à música? 


T: Era por causa disso que não fazia mais nada. Ou seja, se esta professora não tivesse insistido para eu cantar na escola, às tantas não tinha percebido que essa era a minha vocação. Porque acreditava muito naquilo que os meus pais me diziam e se eles diziam que não era uma profissão é porque não era para ser e tinha de ser feliz noutra coisa qualquer. Só que depois quando canto na escola e percebo a ovação que tive dos meus colegas - que foi muito bom - depois vou à Rádio Voz Alenquer fazer uma entrevista e os ouvintes gostaram, pensei “não, agora não há ninguém que me pare, nem os meus pais, porque isto vai acontecer e eu vou fazer de tudo para que aconteça”.


C: Entretanto, no meio disso tudo, há um Sr. Elisiário Pereira. Quem foi este homem e que papel teve na tua vida?

 

T: Ele também teve um papel muito importante, porque foi a ele que eu pedi com 16 anos, numa festa da Rádio Voz Alenquer onde estava a cantar umas músicas da Ágata, dinheiro para gravar um CD. Já tínhamos estado juntos em algumas festas, portanto ele já me conhecia e durante o jantar disse-me “tu cantas muito bem, gosto muito de te ouvir nestas festas” e eu disse-lhe “olhe, o que você podia fazer era emprestar-me dinheiro para eu gravar um CD”. Ele disse que sim. (Risos) Cheguei a casa e pensei “vou levar porrada dos meus pais, só pode”. Não aconteceu, mas a minha mãe ficou perplexa e disse “ai o que é que tu foste fazer, foste pedir dinheiro a um senhor e como é que nós vamos pagar tanto dinheiro para tu gravares um CD” (na altura gravar um disco era mesmo muito caro). E, entretanto, eu disse “não tenhas problemas que eu gravo o disco e vou consegui ter concertos para o pagar“. Gravei o CD e passado um ano consegui pagar o valor que me emprestou na totalidade, mas ele ofereceu-me metade. E a minha vida desde então tem sido na música. 


C: Foi tudo muito rápido.


T: Sim, foi tudo mesmo muito rápido. Em 1996 gravo o CD, 1997 lancei-o, de 1997 para 1998 faço os meus primeiros concertos e, entretanto, encontram-me e convidam-me para fazer um casting para a dupla Tayti e entro na dupla. Foi tudo assim... umas coisas a seguir às outras. Tudo muito rápido.


C: Às vezes se não arriscarmos a nossa vida não anda para a frente. Se com 16 anos não tivesses tido a coragem de pedir dinheiro a esse senhor, às tantas não tinhas tido a carreira que tens. Achas que se não tivesses arriscado, a tua vida seria diferente? 


T: Sim, claro! Sou uma pessoa muito convicta nas coisas que quero e  naquilo que quero alcançar. E, para mim, naquele momento eu só via uma meta: gravar um trabalho discográfico. 

Se os meus pais não tinham dinheiro para o fazer, tinha de procurar noutro sítio. E o Sr. Elisiário podia ter dito que não, porque o dinheiro era dele. Mas na altura pensei: “não, eu vou arriscar. Porque se lhe perguntar, posso ter um sim e também posso ter um não. Mas pelo menos sei que lhe perguntei”. E ali foi o momento decisivo da minha vida, é óbvio! Luto sempre muito pelas coisas e quando não tenho algo pergunto “e porque é que não tenho?”  e “porque é que não consigo?”. Tenho de ouvir o não para saber que não o vou conseguir, mas mesmo assim tento até ao fim conseguir um sim.

“Luto sempre muito pelas coisas e quando não tenho algo pergunto ‘e porque é que não tenho?’  e ‘porque é que não consigo?’. Tenho de ouvir o não para saber que não o vou conseguir, mas mesmo assim tento até ao fim conseguir um sim.”

C: Falaste no projeto Tayti. Como é que aconteceu?

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Dupla Tayti. Fotografia: Costa e Ramos

T: Andava a fazer as primeiras partes dos concertos da Romana, porque nós somos muito amigas há muito anos, e, entretanto, há um espetáculo em que o meu ex-produtor vê-me a cantar e faz a ponte para o casting. Ligaram-me, fui ao casting e sou escolhida. A partir do momento que sou escolhida, foram-me apresentadas as condições e o que era o projeto, mas eu já não estava a ver as condições. Só via o meu sonho a ser realizado, o resto não interessava. Digo isto muitas vezes: “cantei muito porque amo cantar, não pelo dinheiro”. Porque, para mim, o mais importante era ser feliz. É claro que o dinheiro também ajuda, mas não era nada por aí além. Portanto, entrei numa dupla onde achei que de

facto aquele era o meu caminho para poder ser cantora e achava que era uma coisa diferente em Portugal, por ainda não existir nada semelhante. Ter entrado na dupla foi, sem dúvida, formidável. Foram 14 anos onde pisei muitos palcos, viajei muito, conheci muita gente, criei uma bagagem a nível musical muito grande e que agora, estando a solo, me ajuda imenso. Foi extraordinário! 


C: Foram 14 anos de sucesso e intensos. Como é que viveste estes anos? 


T: Não tinha vida. A minha vida era cantar. Não havia Natal, passagem de ano com a família, aniversários... Foram 14 anos muito intensos, onde os amigos foram deixados um bocadinho de parte, porque depois também não tinha tempo para estar com eles. O facto de andar numa carrinha e não levar o meu carro também não ajudava, porque não podia levar amigos comigo aos concertos. Eles iam lá ter, depois iam embora e não tínhamos tempo nem espaço para estarmos juntos. Perdi algumas pessoas, mas tive outras que não perdi e continuam cá. Ligo para eles e sei que estão presentes. Não estou com eles às vezes seis meses, mas quando ligo é só dizer assim “o que é que precisas?” ou “quando é que vamos estar juntos?”. Não há um cobrar. Perdi alguns amigos pelo meio, outros ainda continuam porque sabem que a Tânia é omnipresente... mais ou menos (risos). 


C: Que mudanças aconteceram na tua vida durante este tempo? 


T: Tantas... Tive a mudança da minha orientação sexual, de não ter a ajuda de ninguém e de estar a passar uma fase onde estou num palco e conheço tanta gente e achar que vou ser uma aberração, porque era uma coisa que não se falava na altura. Estava sozinha, porque comecei a viver sozinha com 18 anos. Passei algumas fases na minha vida sozinha e sem ajuda que foram menos boas, mas que fui conseguindo ultrapassar tentando me entender e procurar aquilo que o meu pai sempre me disse: “Tentar ser feliz. Colocando de parte se os outros concordam ou não, eu tenho é de ser feliz. Não chocando ninguém, porque não vim ao mundo para chocar nem para mostrar que sou diferente de alguém, não tenho de provar nada a ninguém, simplesmente tenho de provar a mim própria que quando morrer tentei ser feliz ao máximo”. Portanto, hoje estou feliz. Estou a fazer esta entrevista contigo, porque quero e me está a fazer feliz. A seguir se tiver de ir para casa, vestir o pijama e ver uma novela também vou e estou a ser feliz. Só tento na minha vida ser feliz com as escolhas que faço.


C: Voltando às Tayti, o projeto não terminou da melhor forma. Houve algumas polémicas quando anunciaste a tua saída. Se fosse hoje, terias feito as coisas de forma diferente? 


T: Não. Porque dei tudo o que podia dar numa dupla, fiz o que podia fazer e quando saí ainda disse “o que é que precisam de mim?”, “quanto tempo é que precisam?” e “até quando é que precisam que esteja em palco?”. Ou seja, dei o tempo preciso e necessário para que percebessem que ia embora. Entretanto, quando foi o último concerto e decidiram que aquele era o último, eu saí e fui à minha vida. Até isso respeitei, porque gosto que a minha palavra seja muito importante. Se amanhã te disser que estou aqui, cá estarei. Gostava que o outro também fizesse igual. Cumpri tudo até ao fim e não estou arrependida. Tive de sair na altura que senti que tinha de sair.

“Há um dia em que estou prestes a chegar a Lisboa e quase adormeço ao volante... Pensei: ‘não, não vou morrer na música por causa da dupla.'”

C: É importante percebermos quando já não faz sentido estarmos em determinado projeto. Quando é que percebeste que era o momento de saíres? 


T: Quando começo a fazer muitas viagens do Algarve para Lisboa, porque durante dois anos da dupla vivia cá em baixo (no Algarve), e às vezes ligavam por volta das 15h00 a dizer que tinha um programa de televisão às 08h00 do dia a seguir e eu tinha de organizar a minha vida para isso... não é fácil. Tu quando estás a 300 kms de distância a tua vida tem de ser programada de outra forma e a minha vida neste momento é programada à terça-feira para eu saber o que vou ter no fim de semana ou quinze dias antes para que as coisas sejam programadas. Há um dia que estou prestes a chegar a Lisboa e quase adormeço ao volante... pensei: “não, não vou morrer na música por causa da dupla” e percebi que tinha de sair do projeto, porque não faz sentido isto estar a acontecer na minha vida.



C: Porquê música popular portuguesa? 


T: Boa pergunta! Gosto de cantar um bocadinho de tudo e quando parei de cantar (entre 2012 e 2017) comecei a fazer eventos de karaoke, onde também cantava. Há um dia que estou a cantar em Vilamoura e um senhor, que tem uma editora muito conhecida em Londres, ouve-me cantar Alicia Keys e chama-me à mesa dele. Pensei que quisesse cantar uma música, mas não. Diz-me ele: “olha tu és cantora?”. E eu na altura estava muito triste com a minha vida e então disse-lhe que não cantava e ele disse “olha, tu sabes que tu podias cantar todo o tipo de música e eu podia ajudar-te, porque tenho uma editora em Inglaterra”. Lá está... isto prova que eu posso cantar qualquer tipo e género de música, é verdade, mas a música popular portuguesa sempre foi algo que eu gostei e gosto de cantar. Dá-me vontade de cantar ainda mais em português, porque a minha dicção em português é completamente diferente do inglês. Não quer dizer que eu não saiba cantar bem em inglês, gosto muito de o fazer. Aliás, caso contrário, não tinha tido este convite deste produtor inglês. Sinto que a cantar português sou mais portuguesa e o que é nacional é bom. Sou muito de Portugal. Já tive imensas oportunidades para sair do país e não fui, porque gosto de estar aqui e mostrar o que temos de cultura. Se a música popular portuguesa pode não te cultivar da mesma forma como a música pop te cultiva? Acho que tanto um género como outro podem cultivar de formas diferentes e eu quero lutar por uma coisa que eu gosto, que é a música popular portuguesa. Seja o que os jovens se identificam ou não!


C: Ou seja, qualquer dia temos uma surpresa e apareces a cantar Bryan Adams, por exemplo? 


T: Porque não? (Risos) E ir ao “A tua cara não me é estranha”? Isso é que era extraordinário!


“Sinto que a cantar português sou mais portuguesa e o que é nacional, é bom. Sou muito de Portugal. Já tive imensas oportunidades para sair do país e não fui, porque gosto de estar aqui e mostrar o que temos de cultura.”


C: Alguma vez sentiste preconceito por seres cantora de música popular? 


T: Claro que sim, tens sempre. Vai haver sempre um estigma, mesmo que as pessoas digam que gostam e que não têm, no fundo ele existe. Porque tu vês as pessoas que vão ao teu concerto e vês as pessoas da televisão que vão ver concertos de alguns cantores e outros não vão. Tu vês esse estigma, consegues ver essa diferença.

“Nós não controlamos a nossa vida e foi um amor que não controlei.”

C: Durante o período que fizeste parte do projeto Tayti, vives uma relação complicada. Como é que a explicas? 


T: Não se explica. Simplesmente vi-me dentro de uma relação onde não consegui sair. Quando falava com os meus amigos dizia “nunca vou ter uma relação abusiva”, “ai de alguém que me levante a mão ou a voz, ou me dê uma chapada... eu saio logo”. Nós não podemos mandar para o universo coisas que achamos que controlamos. Nós não controlamos a nossa vida e foi um amor que não controlei. Foi alguém por quem estive muito apaixonada. Entretanto, quando me encontrei cá em baixo, no Algarve, e comecei a viver aqui, foi quando as coisas começaram a correr menos bem e não foi fácil. Para sair ainda levei 5 anos, porque nós deixamos e voltamos... quando amamos alguém achamos que o erro é nosso. Passei pela fase de achar que o erro era meu, depois achava que a pessoa mudava, depois veio a fase de pensar que estava a ser mesmo muito mau e não tinha ninguém que me ajudasse e, por fim, pensei: “não, a minha felicidade não está aqui e vou ter de deixar esta pessoa, porque esta pessoa vai ter de ser feliz com outra e eu vou ter de encontrar a minha felicidade de outra forma. Não estou a ser feliz quando alguém me está a fazer o que está a fazer comigo.”


C: Tu estavas em Lisboa e vens para o Algarve por causa desta relação. É aqui que começas a perder o teu espaço. Quando é que percebeste isto? 


T: Começo a perceber muito rápido, porque quando cheguei ao Algarve o meu telemóvel começou a ser controlado, saio de uma aula ou do ginásio e já me estão a ligar para saber a que horas vou para casa, portanto, comecei a perceber algumas coisas. Mas atenção que isto foi aos poucos, fui sendo levada para isto de uma forma muito normal... que eu achava que era normal, porque nunca tinha tido uma relação assim. Aliás, nas minhas anteriores relações às vezes estava uma, duas ou três, ou quatro horas sem dizer nada e não havia qualquer tipo de problema, porque ou estava a trabalhar ou estava numa entrevista... e estava tudo bem. Comecei a ver que afinal o caminho não era por aí. A pessoa se calhar não tinha muita confiança em mim, nunca dei razões para desconfiar, mas a desconfiança existia nessa pessoa.

“Quando cheguei ao Algarve o meu telemóvel começou a ser controlado.”


C: Ficaste num sítio muito escuro? 


T: Muito mesmo. 


C: A certa altura pedes ajuda aos teus pais, como é que foi? 


T: Isso aconteceu porque é assim... tu quando estás numa relação tóxica como eu estive, nós tanto tínhamos uma semana que estávamos bem, como na outra semana estávamos mal e depois eu deixava e fugia, procurava ajuda que não encontrava porque, é um bocadinho triste quando se passa por uma situação destas, e eu não queria dar a entender a ninguém que estava a passar por isso. Entretanto, encontro uma pessoa no ginásio onde eu dava aulas e vê-me num dia em que eu estava muito triste e pergunta-me o que é que eu tinha. Tomava sempre banho no ginásio e deixei de o fazer para começar a falar com essa pessoa que me começa a dar forças para eu sair desta relação, que me estava a fazer mal. Quando isso acontece, pensei “ok, a única forma que eu tenho de sair desta relação tóxica é fugir um dia que exista algo menos bom e ir para a casa dos meus pais e contar-lhes, porque aí vou ter forças para sair”. Porque eu própria não tinha forças, saía e voltava a entrar, porque a pessoa pedia desculpas ou dizia outras coisas que me conseguia ludibriar com o maior amor do mundo que existia. Há um dia em que me ponho dentro do carro e fujo para Lisboa. Quando chego a casa dos meus pais para contar, pensei “agora é que eu vou deixar” e foi isso que fez com que conseguisse ter forças e “vergonha” dentro de mim para deixar aquela relação. O meu pai, de facto, não aprovou, como é lógico, e sempre foi contra a violência doméstica. A minha mãe também ficou incrédula, porque não conseguia ver a cara da pessoa com aquilo que se estava a passar e o que lhes contei. E, entretanto, isso deu-me forças para sair. É claro que a pessoa voltou a ligar e tentou que voltasse para casa e ainda voltei, mas só na base da amizade. Mas depois percebi que mesmo com a amizade as coisas estavam impossíveis e e tive mesmo de sair de casa.

“Eu saía e voltava a entrar, porque a pessoa pedia desculpas ou dizia outras coisas que me conseguia ludribriar com o maior amor do mundo que existia.”

C: Quando é que sais definitivamente de casa? 


T: Passado umas semanas de ter contado aos meus pais, saí de casa com a roupa que tinha no corpo e depois fui tendo as minhas coisas da forma que a pessoa ia querendo. Ou seja, só tive acesso à minha roupa quando a pessoa queria dar-me a roupa e só tive acesso às minhas coisas, que tinha dentro de uma garagem em Lisboa, quando a pessoa entendeu. A pessoa é que foi mandando na forma que queria que eu tivesse as minhas coisas. Acabei a relação em junho e só tive acesso a tudo o que era meu em novembro. E perdi coisas nos entretantos... tu quando amas e quando estás com uma pessoa assim, achas que isso não te vai acontecer e passar por isto fez-me pensar que nós não podemos criticar o outro ou quem esteja a passar por uma situação semelhante, temos é que compreender e ouvir a pessoa. Para mim, a chave para eu conseguir sair disto, foi ter alguém que conseguiu ver que eu não estava bem, ouvir-me, não me apontar o dedo, não dizer “tens de sair”, simplesmente ouviu. Houve um dia que perguntei “achas que isto é saudável?” e a pessoa disse-me “não, mas eu nunca te vou responder a nada nem nunca te vou dizer para tu saíres porque a resposta está em ti, tu é que tens de procurar essa resposta”. Nós para sairmos de uma situação destas temos de ser nós a ter essa força, porque não é alguém de fora que nos vai ajudar. Nós conseguimos sempre voltar, sabes? São coisas que não explicamos e eu voltei muitas vezes em cinco anos. Esta pessoa teve um papel muito importante.

“Acabei a relação em junho e só tive acesso a tudo o que era meu em novembro.”

C: Às vezes só precisamos de ser ouvidos... 


T: Exatamente. 


C: Certamente não eras a mulher que és hoje. 


T: Não, de todo.


C: Deixaste-te levar por tudo o que aconteceu? 


T: Mais ou menos... Deixei-me levar ao ponto de deixar de gostar de mim, de não  confiar em mais ninguém, que a vida era mesmo aquilo e de pensar que, se calhar, só se terminasse com a minha vida é que aquilo ia terminar, porque depois eu achava que a pessoa ia estar sempre nas minhas costas mesmo que eu a deixasse... isto passou-me tudo pela cabeça. Há um momento na minha vida, quando deixo esta relação, passado dois meses, que aparece uma pessoa na minha vida que me começa a mostrar que a vida tem outro lado (que eu já tinha tido, mas achava que já não existia) e que afinal podemos ser felizes e encontrar a pessoa certa.


“Deixei-me levar ao ponto de deixar de gostar de mim, de não confiar em mais ninguém (...) só se terminasse com a minha vida é que aquilo ia terminar.”


C: Voltando à música, tu estiveste muito tempo afastada da música... 


T: 5 anos. É muito tempo!


C: Quando é que percebes que estava na altura de voltares à música?


T: Tudo isto que te contei até agora, aconteceram umas coisas a seguir às outras e, nos entretantos da minha vida, deixo uma relação tóxica para ter uma relação saudável e tenho o meu pai mal de saúde. Passo a ir quase todos os fins de semana a Lisboa para o ajudar (entre 2012 e 2015). Em 2014 deixo a tal relação tóxica e no fim do mesmo ano entro numa relação saudável e começo a ajudar o meu pai, a ir ao hospital vê-lo e a tentar fazer tudo o que estava ao meu alcance para o ajudar. A relação que comecei fortalece-me ainda mais e o meu pai aceita a pessoa com quem  estou. Ele acaba por falecer e passado um ano e meio (no final de 2016), viro-me para a minha cara-metade e digo-lhe “o que é que achas de eu voltar a cantar?”. Porque no funeral do meu pai é falado porque é que eu não voltava a cantar, porque o meu pai adorava que isso acontecesse. Senti que tinha a pessoa certa ao meu lado para voltar a cantar. Tu para voltares a cantar, precisas de ter as pessoas certas ao teu lado, principalmente a tua cara-metade tem de ser a pessoa certa, porque tem de aceitar e perceber. Esta vida não é uma vida fácil, toda a gente pensa que isto é um mar de rosas e não é. Entretanto ela diz-me assim “se tu achas que sim, porque não tentares?”. Isto deu-me a força que eu precisava. Comecei a ir ter com as pessoas certas e a fazer as coisas aos poucos sempre com a ajuda dela nas coisas que eram necessárias. De certa forma, foi ela que me começou a ajudar e a dar forças para que eu voltasse a cantar. Ainda tive algumas coisas menos boas, nomeadamente, telefonemas a dizer que eu não havia de voltar a cantar e que as coisas não iam correr bem. Entretanto, a minha cara-metade diz-me “não são os outros que vão dizer que vais deixar de cantar, és tu que vais dizer quando queres parar de cantar”. Isto dá-me ainda mais forças para continuar e pronto... desde essa altura que sinto que estar com ela é muito importante, porque me dá uma força extraordinária para ter a carreiquando vou em trabalho e estar lá para auxiliar na parte de road manager. Neste momento, sinto-me com força para continuar na música e ter aquilo que tenho neste momento, porque tenho alguém atrás de mim como ela que me ajuda. E não só, também tenho a País Real (editora) onde entrei em 2019 e, nessa altura, só me disseram “o que é que precisas?”. O Paquito, a Ana e a Carla são as pessoas que me ajudam e apoiam em tudo o que faço e quando faço alguma coisa também lhes pergunto a opinião. Tenho uma equipa extraordinária.


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Tanya durante concerto em Armamar. Fotografia: Miguel Rocha Pinto/CONTRAPONTO

“Esta vida não é uma vida fácil, toda a gente pensa que isto é um mar de rosas, e não é.” 

C: Isso é tão bonito! 


T: É mesmo... 


C: Quando é que a tua cara-metade aparece na tua vida? 


T: No final de 2014, passado dois meses de ter saído da relação tóxica, achava que ia embora do Algarve e ia voltar para Lisboa, e afinal não! (Risos) A vida puxou-me para Lagos e começou a mostrar-me que Lagos era uma cidade extraordinária e aqui senti-me, de certa forma, protegida. Gosto muito de viver aqui!

“A vida puxou-me para Lagos e começou a mostrar-me que Lagos era uma cidade extraordinária e aqui senti-me, de certa forma, protegida. Gosto muito de viver aqui.”

C: Sentes que reaprendeste a amar? 


T: Sim, claro! É essa pessoa que me ajuda a reaprender a amar e perceber que brincadeiras existem sem haver nada de mal a acontecer, sem haver uma discussão... Que podemos discutir e olhar  para os  outros e dizer se  aquela pessoa é  bonita ou não, sem haver uma discussão. 


C: Ser saudável!


T: Exato, ser saudável! Eram coisas que não aconteciam na outra relação. Agora tenho uma relação muito saudável e a pessoa com quem estou, a Isa, é, de facto, extraordinária. Ela ajuda-me muito.  


C: Como é que a tua cara-metade... podemos  dizer o nome? 


T: Sim, claro!


C: Como é que a Isa, que está do outro lado e te encontra bastante frágil, lida com tudo isto?


T: Não foi fácil, porque nós de certa forma nem namoramos. No início da nossa relação, ainda estava a tentar discutir quando é que iria ter as minhas coisas... foi difícil! Aliás, pensei que se não fosse nessa altura que ela se iria embora, então vai ficar para o resto da minha vida. (Risos) Ela conseguiu lidar com isso, ter estômago para lidar com uma situação que não foi fácil, porque ainda houve mesmo muita negociação para ter as minhas coisas. Senti que aos poucos ela ia compreendendo que eu estava, de facto, numa situação muito delicada. Ela tentou mostrar-me o melhor lado dela e a pessoa que é... qualquer pessoa se “apaixona” por ela, porque é um ser humano extraordinário. Gosto de mostrar quem ela é, porque foi essa pessoa que fez com que a Tânia que se encontrava num sítio escuro viesse outra vez à tona e voltasse a viver como antes. E isso fez-me muito bem! 

“Agora tenho uma relação muito saudável e a pessoa com quem estou, a Isa, é, de facto, extraordinária. Ela ajuda-me muito.” 

C: Continuam juntas, felizes e casaram. Como é que foi o casamento? 


T: Casei com ela porque queria que o meu pai fosse ao casamento. O meu pai morre a 29 de agosto de 2015 e o casamento foi a 18 de setembro... Tive um casamento agridoce, porque não tinha o meu pai comigo e fomos só nós as duas e cinco pessoas (testemunhas e padrinhos). Foi um casamento onde estava muito feliz porque estava a casar com a mulher da minha vida, mas ao mesmo tempo senti que aquilo que eu queria, que era o meu pai presente, não aconteceu.


“Tive um casamento agridoce, porque não tinha o meu pai comigo.”


C: Falas muito do teu pai, és menina do papá? 


T: Sou. (Risos)


C: Qual foi o melhor conselho que o teu pai te deu? 


T: Ser feliz naquilo que faço, porque se nós trabalharmos em algo que não sentimos que é trabalho e que nos transmite felicidade, é muito melhor. Faço duas coisas na minha vida que amo: cantar e ser professora de fitness. Nem que trabalhe 12 horas por dia, adoro o que faço e sou feliz!

“Faço duas coisas na minha vida que amo: cantar e ser professora de fitness.” 


C: E nota-se a tua felicidade. (Risos) Como é que o fitness aparece na tua vida? 


T: Começo a ter muitos concertos com a dupla Tayti e percebo que preciso de fazer exercício físico. Já gostava muito da prática de exercício, atenção... (risos) mas, entretanto, ao fazer exercício físico, senti que queria fazer um bocadinho mais e que gostava daquilo. Começo a fazer aulas de body pump e body combat e há um dia que pergunto a um professor se era possível tirar alguma formação na área do fitness. E ele diz-me que sim! A partir daí, dá-me o contacto de uma empresa que trabalha muito com fitness em Portugal, a Manz, e começo a tirar cursos de fitness: body pump, body combat, RPM (ciclismo indoor)... Começo a sentir que tenho de ter mais formação para além disso e então tiro uma formação intensiva do IFE (para aprender a ser instrutora de fitness, anatomia, fisiologia...). Daí em diante, durante dez anos, tirei imensos cursos: pilates, ioga, cycling, flexibilidade... porque senti que tinha de saber um pouco mais. Imagina o que é chegar um aluno ao pé de ti, depois de acabar uma aula de body combat, e dizer “tenho um problema aqui no joelho e preciso de saber o que tenho”. Tu podes não saber porque não és médico, mas podes ajudar com o tipo de exercícios que a pessoa pode fazer. Estou sempre em formação! Começo, então, por dar aulas num ginásio e depois abri o meu estúdio em 2020, em plena pandemia.


C: Tu trabalhas em dois mundos onde é preciso estar presente de forma física. Como é que viveste a fase da pandemia? 

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Tânia no seu estúdio de fitness. Fotografia: Tânia Lima

T: Comecei a dar aulas online, porque os meus clientes sabiam que eu precisava de ganhar dinheiro. Nesta fase eu e a Isa investimos em duas casas de alojamento local e ficamos a zeros, porque ficou tudo parado. Portanto, precisava mesmo de dar aulas para poder comer e viver. Tive clientes extraordinários, inclusive um senhor que me perguntou se eu precisava de dinheiro e se me podia ajudar de alguma forma, diz ele “eu sei que tu estás a passar por dificuldades”. Disse que não, porque a Isa não aceita dinheiro de ninguém, mas que se desse as aulas online já era uma ótima ajuda que me davam. Tive clientes que se mantiveram comigo e consegui crescer. Neste momento só trabalho por referência, ou seja, as pessoas vêm ter comigo por sugestão de outros, e a maior parte do tempo só falo inglês porque tenho muitos alunos estrangeiros. 



C: Como é que geres os dois mundos? 


T: De segunda a sexta dou aulas e aos fins de semana dou concertos. É uma vida muito corrida, mas bonita!

“É uma vida muito corrida, mas bonita.”

C: És feliz? 


T: Sou muito feliz! (risos)


C: (Risos) Então é o mais importante! Vamos puxar a fita do tempo atrás. Quando é que percebes que gostas de mulheres? 


T: Em 2003. Tinha 23 anos! Foi horrível... até então tinha tido namorados e estava tudo bem. Quando me apercebo que estou com uma mulher e que aquilo é a minha vida e afinal estou a ser feliz, tive de esconder porque podia ser uma aberração. É horrível, porque não tens meios de comunicação a falar da situação e quem falava na altura era sempre de uma forma depreciativa. E eu achava que era uma aberração. O medo existia, porque tinha receio que me apontassem o dedo por ser diferente. Era algo que não se falava e, mais uma vez, não pedi ajuda a ninguém. Tive de tentar superar que não era uma aberração, que aquilo é que era a minha felicidade, mas tinha de a viver entre quatro paredes. Vivi assim durante dez anos. Tinha medo que a minha família não aprovasse e passei novamente pelo processo de voltar a gostar de mim. Tinha 23 anos, era uma moça pequena, e não tinha ninguém ao meu lado que me ajudasse. Agarrei-me aos meus amigos gays que me mostraram que podia ser feliz e normal. Foi com eles que superei esta fase da minha vida. 


C: Mas dez anos é muito tempo... 


T: É. 


C: É muito tempo a viveres fechada.


T: Pois é... mas vivi. 


C: A tua família não sabia e, pelo que sei, é um pilar importante na tua vida.


T: É sim! Foi difícil, muito difícil. Tive a ajuda dos amigos. Passávamos fins de semana incríveis, a beber e a conversar, muitas vezes sobre o assunto. Eram quase fins de semana de terapia, sabes? Aquilo para mim era mesmo terapêutico. Dez anos de facto é muito tempo, mas depois senti que era uma coisa normal para mim e tinha de assumir de uma forma natural. Não contei a ninguém, simplesmente começaram a aperceber-se. Na altura a única situação menos boa que aconteceu foi quando a minha colega da música se apercebeu e colocou algumas questões. À minha mãe fiz questão de contar e a reação foi logo “ai o que é que as pessoas vão pensar”, portanto não foi a melhor ajuda. Ao meu pai não contei logo, porque ela não quis que eu contasse, porque ele não iria aceitar.

“Vivi assim durante dez anos. Tinha medo que a minha família não aprovasse e passei novamente pelo processo de voltar a gostar de mim. ”

C: Mas quando é que percebeste que estava na altura de conversares com os teus pais? 


T: Quando, interiormente, sinto que a aprovação dos outros não me vai mudar, porque é aquilo que eu quero para a minha vida. Quando já estava certa da minha escolha (atenção que não é uma escolha, porque tu não escolhes, é algo que acontece na tua vida sem tu te aperceberes), fortaleci-me para que qualquer coisa que fosse dita de forma depreciativa, não me incomodar. 


C: E o teu pai? Quando é que conversaste com ele? 


T: Decidi contar-lhe num dia que me chateio com a minha mãe, e ele ficou estupefacto. Contei-lhe, meti-me dentro do carro e fugi. Esperei que ele me ligasse e passado dois dias o telefone toca. Ele só me disse que me amava e que a minha orientação sexual não iria fazer com que ele me amasse menos ou mais, nada iria mudar. De facto, foi a pessoa que aceitou melhor a minha decisão, sem saber ler nem escrever. 


C: A partir daí fica tudo bem? 


T: Sim!


C: E o teu irmão? 


T: Não tem opinião. Mas está tudo na boa! Ele fala pouco também nunca se falou do assunto. Ele aceita e respeita, é o mais importante. As minhas sobrinhas sabem e falam das tias. E está tudo bem!


C: Há um ano entraste no Big Brother Famosos. Aceitaste logo o convite? 


T: Não. (Risos) A Ana liga-me e diz-me assim “tenho um convite para te fazer, estás com a Isa?” e eu disse “estou” e diz ela “estão sentadas?”. E eu pensei logo: “pronto o que é que aí vem?”. E ela começou a contar que fui convidada para entrar no Big Brother Famosos. A minha resposta foi logo “não” e ela disse para eu pensar e conversar com a Isa. O meu maior receio era que falassem da minha vida e da minha orientação sexual, daí ter dito logo que não. Quando falei com a Isa ela diz-me que me apoia e aceita tudo o que eu queira fazer, desde que não mentisse que estava com uma mulher e isso eu nunca fiz. Simplesmente sempre falei da minha cara-metade sem divulgar quem era, porque sabia que se o fizesse as revistas iriam fazer de tudo para a descobrir e expor, e ela não iria gostar. Então decidimos que eu iria entrar sem ter como foco a minha vida pessoal, mas sim a música porque isso sim era o que mais me interessava: projetar a minha carreira. Nunca quis que a minha orientação sexual fosse um foco. Neste momento está a tornar-se, porque falo de algo que há muita gente no meio artístico que não fala, nem apresenta a cara-metade, por ser do mesmo sexo. Sinceramente, acho que até faço bem falar porque, para aquelas pessoas que sentem vergonha ou acham que podem ser uma aberração, podem ver em mim um exemplo. 

“O meu maior receio era que falassem da minha vida e da minha orientação sexual, daí ter dito logo que não.”

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Tanya no BB Famosos. Fotografia: TVI

C: Só na última semana é que uma revista expõe a tua vida pessoal. Como é que viveste isso? 


T: Já estava à espera, porque sabia que quando se entra para um programa daqueles, mais tarde ou mais cedo, descobrem tudo. Mas achei que tivessem descoberto vindo a Lagos ou perguntando a alguém da minha família e não a partir de alguém que partilhou a vida comigo durante 14 anos na música. Isso deixou-me triste. 


C: Doeu? 


T: Sim, porque acho que ela não tinha de vir a público falar de algo que era tão íntimo. Se alguém tinha de falar era a minha cara-metade, a Isa, ou alguém da minha família que, eventualmente, perguntasse. Acho que não fez sentido. 


C: A experiência no Big Brother foi boa? 


T: Foi ótima. Só houve uma coisa que não correu bem... parti um pé lá dentro. (Risos) À parte disso, foi uma experiência social incrível! As pessoas gostaram e gostam de mim. Tenho ainda mais concertos, pessoas a mandar mensagens, a virem ter comigo na rua para elogiar o meu trabalho e a mandar beijinhos para a Isa. Isto é extraordinário e deixa-me muito feliz.


C: Na última entrevista que deste, falaste de um episódio menos feliz da tua infância. Tu foste abusada com seis anos por um homem mais velho. Quando é que te apercebeste que isso estava a acontecer? 


T: Nunca te apercebes. É uma situação que começa a acontecer e eu não entendi o que era, porque era pequena. Achei que não era uma coisa normal. Senti-me mal e queria contar aos meus pais, mas, entretanto, não contei porque a pessoa em questão pediu para não contar. Senti-me super mal. Sabia que aquilo não era normal, mas não sabia o que era. 

“É uma situação  que começa a acontecer e eu não entendi o que era, porque era pequena.”

C: Como é que sais disso? 


T: Comecei a afastar-me e a ameaçar contar aos meus pais... que se voltasse a acontecer, contava a alguém. Tentava não estar com essa pessoa, evitava-a e ameaçava contar o que estava a acontecer.


C: Alguma vez sentiste necessidade de confrontar esse homem? 


T: Não. Porque, entretanto, ele morreu. Ficou confrontado da melhor forma. Mesmo que ele tivesse vivido mais anos e eu o tivesse confrontado, o que é que isso iria mudar na minha vida? Percebes? Já tinha acontecido, a única coisa que eu queria era que ele nunca o tivesse feito. Era mais fácil se ele não tivesse feito. 


C:  Como é que vives com isso e de que forma trabalhaste este trauma? 


T: Fazendo terapia. Para falar disto, como estou agora a falar contigo, tive de fazer terapia. Foi o melhor que fiz. Achava que tinha culpa e só quando, em terapia, me disseram que  não tinha, é que percebi que a culpa não foi minha.  


C: Ainda tens mágoas ou já está tudo arrumado?


T: Não, tratei das minhas mágoas em terapia. E as mágoas quando se tem são nossas, não são dos outros. E nós não temos de as oferecer a ninguém. Foi um processo longo e consegui tratar. Parei e acho que tenho de voltar, porque tu tens sempre algo a aprender e a melhorar em ti.


C: É bom fazer terapia, não tem de ser vista como uma coisa má.


T: Claro que não. Mas na altura, entre 2005 e 2007, falava-se muito mal da terapia. Quando a Isa aparece na vida começa a falar-me da terapia e do bem que lhe tinha feito. Foi aí que comecei a pensar que talvez me fizesse bem.

“E as mágoas quando se tem são nossas, não são dos outros. E nós não temos de as oferecer a ninguém.”

C: Sonhos profissionais, tens? 


T: Claro. Ter outra música que faço tanto sucesso como o “Coração Dividido”. 


C: Mas já tens outras músicas com sucesso, como o “Chora Bebé”.


T: Claro, mas sabes que eu quero sempre mais. Não quer dizer que não esteja bem com o que tenho, mas quero mais.


C: E sonhos pessoais? 


T: Fora ser mãe, é ter casa em Lisboa que é um projeto a curto prazo.


C: Mas imaginas-te a viver fora do Algarve? 


T: Não, gosto mesmo da tranquilidade e estabilidade do Algarve. Tenho o meu espaço, sou referenciada de boca a boca, tenho os meus clientes e não sinto que tenha ninguém  atrás de mim a roubar-me os meus clientes. Tu vais para o Porto ou para Lisboa e não tens isso. Tu aqui tens qualidade de vida.


C: Há alguma coisa que queiras fazer na tua vida, que ainda não tenhas feito?


T: Ser mãe. 


C: E então? 


T: Então tenho de ter tempo, que não tenho. (Risos) Preciso de tempo para ser mãe. Não preciso de todo o tempo do mundo, porque mesmo estando no fitness e na música, a criança cresce da mesma forma. Eu sei disso, mas preciso de ter um bocadinho mais de qualidade, de tempo e espaço. Preciso de ter uma casa em Lisboa para a criança ter o espaço dela e, neste momento, não tenho. Ou seja, tenho de construir a minha vida com o melhor para dar a essa criança. 


C:  Não é um capítulo fechado.


T: Não é, e vai ser aberto. Não é já, mas vai ser!


C: O  que dirias à Tânia que cantou naquela festa da escola? 


T: Para voltar a fazer igual! (Risos) Ou melhor.


“As pessoas gostaram e gostam de mim, tenho ainda mais concertos, pessoas a mandar mensagens e a virem ter comigo na rua para elogiar o meu trabalho e a mandar beijinhos para a Isa. Isto é extraordinário e deixa-me muito feliz.” 

Tânia Lima

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