VCI: a crónica de um cancro anunciado
- Miguel Rocha Pinto
- 1 de jan. de 2024
- 3 min de leitura
Atualizado: 21 de jan. de 2024
Mais trânsito e mais dores de cabeça. O retrato de uma das vias mais congestionadas do país.

Via de Cintura Interna (VCI), junto ao Nó das Antas, no Porto. Fotografia: LightRocket/Getty Images
“O trânsito no Porto está cada vez pior.”
Beatriz Ferreira, 25 anos
É esta a frase que mais se tem lido e ouvido nas últimas semanas, aliada a congestionamentos nas principais artérias da cidade e estacionamento indevido. A Via de Cintura Interna, conhecida por uma grande maioria como VCI, é a principal via de locomoção que circunda a cidade do Porto (e parte de Vila Nova de Gaia), estando construída em forma de anel, atravessando os principais polos económicos e habitacionais da Invicta, como a Boavista e as Antas, onde se concentram muitas pessoas que diariamente entram e saem da cidade.
Embora seja a principal via de acesso à segunda maior cidade do país, existem alternativas para a VCI que, embora sejam pouco usadas, são eficientes e podem desviar grande parte do trânsito que entra no Grande Porto. Exemplo disso é a Circular Regional Exterior do Porto (CREP), que foi construída com o objetivo de afastar da cidade quem vem do Norte e pretende seguir para Sul, evitando criar engarrafamentos. Álvaro Costa, professor de Eng. Civil na Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto (FEUP), afirma que a grande solução para o trânsito é “apostar no transporte público”, retirar da VCI as pessoas que “não andam a criar valor (à cidade)” e melhorar a taxação das estradas, remetendo novamente para a CREP. Álvaro Costa garante que “há muita gente que tem de usar a VCI porque há autoestradas concorrenciais que estão taxadas”.
Por outro lado, Cecília Silva, especialista em mobilidade e professora associada na FEUP, sublinha que a prioridade é apostar na “multimodalidade” – uma solução em que pode escolher o modo de transporte mais útil para o seu percurso. Cecília Silva reitera que a cidade “está construída para o automóvel” e que este é um “problema estrutural” da cidade.
Desde o início da pandemia que há mais carros nas estradas portuguesas. A insegurança face aos transportes públicos fomentou o aumento do uso do automóvel, números que sobem de ano para ano. Segundo o Instituto da Mobilidade e dos Transportes (IMT), no último trimestre de 2023 entraram no Porto, através do nó da A3 (um dos principais acessos), uma média de 138 mil automóveis, valores que têm subido desde 2020.
Aliado ao aumento do trânsito, tanto na VCI como no centro da cidade, estão os crescentes congestionamentos provocados pelas obras da Metro do Porto, decorrentes da criação da linha Rosa (linha circular) que irá ligar a zona de São Bento à Boavista. Na Avenida dos Aliados, por exemplo, onde as obras decorrem há mais de três anos, a principal ligação entre a estação de São Bento e a Praça da Liberdade está cortada, numa altura em que a empreitada entra numa nova fase. Em novembro do ano passado, o presidente da Câmara Municipal do Porto (CMP), Rui Moreira, admitiu que a autarquia “não concederá quaisquer licenças para qualquer obra da linha Rubi que provoque alteração ou novos constrangimentos na mobilidade” e pediu ao Governo uma “urgente avaliação” do estado das obras de ampliação do Metro do Porto.
O CONTRAPONTO entrevistou alguns automobilistas num dia de trânsito (e em hora de ponta) no centro do Porto, sendo que muitos culpam a Metro do Porto pelo atraso nas obras, que tem dificultado o trânsito na cidade. Beatriz Ferreira, 25 anos, afirma que “o Porto não aguenta com tantas obras” que dificultam a locomoção, afetando não só quem utiliza o carro, como quem usa transportes públicos. “Quem faz este percurso de autocarro – do Campo Alegre até à Batalha – demora muitas vezes mais de uma hora, por conta dos congestionamentos das obras”, garante Beatriz, que aponta o dedo à CMP pela sua aparente “descontração” para com o problema. A jovem de 25 anos deixa claro que numa cidade como o Porto “quando cortamos uma rua, estamos a destabilizar o trânsito todo”.
Embora aparente ser um problema fácil de resolver, a mobilidade na cidade do Porto é um assunto bem mais complexo. O uso excessivo do automóvel, a concentração muito elevada de automóveis na VCI e os atrasos no transporte público são alguns dos fatores que fazem com que a cidade esteja cada vez mais longe de atingir a neutralidade carbónica, meta que faz parte dos planos de Rui Moreira.
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